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Mostrando postagens de 2013

Canto da Compaixão

“Oh, morte! Tu que és tão forte”, deixe-me terminar um soneto antes que possa me levar depois do ultimo gole de conhaque. Poesia arquitetada do vínculo carnal de uma jovem que a muito sua foice ceifou dos meus braços. Permita que a ode dessa flor seja entoada em sua homenagem. Pintarei este poema dos sons graciosos das noites que fizeram singulares minha embriaguez em sua fonte inesgotável de fel. Preciso de tempo, preciso que a garrafa não acabe, que a poesia seja concluída antes que você, morte, me procure para ser seu par, numa dança metafísica pelo universo desconhecido. * “Oh, morte! Tu que és tão forte”, permita-se ler minhas confissões para talvez me deixar terminar meu maior erro – a poesia, pois me carregará em seu barco sem a companhia de Dante para poder me calar ao lado de minha amada.

Tempos Difíceis São Cantados

                            “Há muitas maneiras de se ter o blues. Tempos difíceis te dão o blues." A vida é se jogar de um parapeito sobre um copo d’água para sentir o tamanho do frescor do pomo da discórdia. O mundo parido em infinito vazio. Mas a encruzilhada cheira à vida, os espíritos se atravessam e surgem nas sombras com gaitas e violões. Uma dama se destaca como rainha dos condenados, de cantos agudos, “Come on and baby, baby”, soltando seu blues enquanto palmas ritmadas acompanham as batidas dos corações. E a força das negras reparte esse pomo maldito. Competem com o mais infinito barulho do vazio. Agora chove na encruzilhada, não há mais vida seca, o chão é sem dono, voar sem paraquedas, porque todos dançam, todos sentem, é da rainha que surge o blues da dor do infinito, do que não pode ser dito, a quem não foi chorado. Ali, na encruzilhada as almas se cruzam e o blues é livre.    A ninfa frenética se joga, se abandona. Reconhece que seu corpo já não mais

"A morte surda caminha ao meu lado"

A morte como chuva que retorna ao rio como areia que percorre o mundo sem importância morte sem ser nem existir sem fome, orgulho deixando seu rastro de bigorna rastro de forca rastro de alivio sons, suja, digna a morte em palavras nos braços cruzados a morte surda presente na vida

Poema de Lavoura

As folhas de ventos das mãos do poeta com a memoria  de museu de entulhos sementes da imaginação regada com labor tratando de sua plantação as fotos do vento, do cheiro das palavras adubando a areia branca cria o polém cinza do grafite poema um dia proferido em solidão nunca escrito com sangue não retorna ao ar

Forte poeta

A escrita encontra a palavra no meio do caminho, como em toda relação elas brigam, xingam-se, maltratam-se, separam-se... na labuta da perfeição. palavras que desistiram, frases cortadas, o dito não, o talvez a poesia sem momento sem tamanho ou talento poesia sem fome não cair em armadilhas de vãos diálogos  olhar para o abstrato das coisas, Amar rio desenhar na folha o comprimento da sua imaginação, com palavras pequenas como portas - que abrem um mundo, uma casa, uma história; ou palavras grandes como  centopeia - que cem pernas tem mais que leão pausa o poeta precisa ser forte. precisa sorrir porque é um bobo que nunca chegara à perfeição.

O Bêbado Equilibrista

Era o bêbado que vinha na madrugada, o bêbado equilibrista. Por praças, casas, bancos e bordeis, com o litro, a cachaça quente. O bêbado se fazia noite, em silêncio andava por entre as prostitutas que embelezam os casebres, “o que seria da noite sem as prostitutas”, vestimenta, maquiagem, interesse, entrega a profissão que embeleza a noite, prazer na noite. De gole em gole, de noite a dentro o bêbado equilibrista se faz noite. Do cemitério ao meio da pista, o equilibrista bêbado contempla do alto as luzes da cidade “ não opaca as luzes das estrelas, ao contrário, reinventam o céu, caem sobre a terra. A terra agora parece céu, cheio de estrelas e belezas”.

Do dia que há muito não percebia

                                                                 Só o silêncio faz rumor no voo das borboletas                                                                                      (Manoel de Barros) Era dia quando o trio dos pássaros me tomou de agudo e como alma saída do corpo levantei-me, galos, cachorros, vento, fazia tempo que não os ouvia. Os pés já não pareciam mais com os das pedras que de tão espessos prendem o seu movimento.  Bebi um gole d'água em um copo que parecia um buraco empalhado. O cabide de madeira com delicadeza me estendia um dos seus nove braços, com educação segurava meus chapéus. Nas paredes da cozinha vi flores marrons, estrelas sem pontas, sol, girassol, batedeira.  A minha cozinha produz cheiro e gosto. Gosto mais do cheiro do café do que o gosto, é vida pela manhã. O banho que me cobria com um vestido morno.  Escolhi o chapéu listrado e fui trabalhar.

Tinha mundo

“Eu tinha tudo tinha mundo era mudo sonhava Era bicho no espreguiço que eu dava E tinha gente que fluente la dos inglês Que viu as pernas passadas do português E lhe foi indagar Por que essa mansidão não tens o que trabalhar? Continuei mudo sentado dono do mundo a contemplar”

Quando tentei voltar a ser criança

Depois dos 65 anos Resolvi voltar a ser criança. Percebi que não era difícil. Comecei pelas contas, troquei as do banco pelas das balas da mercearia. Resolvi que não sabia sorrir no emprego, talvez isso fosse a causa dele ser chato, vários papéis com palavras chatas, enfadonhas. Montei uma pastelaria, sonho antigo, adoro pastel, ia as feiras e sempre comia dois, carne e queijo, caldinho de cana, docinho, como mel. Passei a não usar terno, aquilo cobria me até os braços, me faz lembrar roupa de hospício. Usava minha camiseta mal passada, uma antiga com furos, tão solta, confortável.   Quando percebi que criança não tem medo de lama, gosta de bicho e anda sempre de pés descalços, e eu adorava fazer isso, mas agora tinha pavor de chão: “Chão imundo”. Comecei a andar de pés descalços e muitas vezes sujo de brincar com meu quintal. Lembrei que eu gostava de versinhos, cordel e samba, papai sempre cantou versos, toadas, samba de coco, aquilo era alegre, a família em volta, uns usando a