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Tempos Difíceis São Cantados



                            “Há muitas maneiras de se ter o blues. Tempos difíceis te dão o blues."


A vida é se jogar de um parapeito sobre um copo d’água para sentir o tamanho do frescor do pomo da discórdia.
O mundo parido em infinito vazio.
Mas a encruzilhada cheira à vida, os espíritos se atravessam e surgem nas sombras com gaitas e violões. Uma dama se destaca como rainha dos condenados, de cantos agudos, “Come on and baby, baby”, soltando seu blues enquanto palmas ritmadas acompanham as batidas dos corações. E a força das negras reparte esse pomo maldito. Competem com o mais infinito barulho do vazio. Agora chove na encruzilhada, não há mais vida seca, o chão é sem dono, voar sem paraquedas, porque todos dançam, todos sentem, é da rainha que surge o blues da dor do infinito, do que não pode ser dito, a quem não foi chorado.
Ali, na encruzilhada as almas se cruzam e o blues é livre.   
A ninfa frenética se joga, se abandona. Reconhece que seu corpo já não mais lhe pertence, está intimamente ligada ao blues. Vê as cordas tinirem de sofrimento, pois diz algo, a mente atende o corpo responde.
Tempos Difíceis São Cantados. No blues o silêncio do amor ecoa pelas cordas. A voz da bela dona de branco deleitando o surdo amor, as mãos calejadas, os guetos escuros.
Na encruzilhada as respostas não são postas em grafia, não há estudo ou modernidade - onde impera o blues não a grau de profissão. Os junkes sentem o corpo obedecer ao chamado dos jans e se entortam como cobra no bote, o espírito procura uma cura, uma magia e só no blues as encontra.

                     “ Oh, sente-se lá, oh, conte aqueles pingos de chuva... Vais sentir-se apenas como aqueles pingos de chuva, quando eles estão caindo, querida, a toda sua volta.”

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